Crônica: Sobreviventes da Obra

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Crônica: Sobreviventes da Obra
Por Silvia Generali da Costa, psicóloga e assessora em saúde do SIMPE-RS

Já tive notícias de casais que se separaram logo após a construção de uma casa. A tão sonhada moradia acabou se transformando em um verdadeiro pesadelo na vida dessas duplas desafortunadas. Por que um casamento não resiste a uma obra?

Eu me fazia essa pergunta até optar por uma pequena reforma no meu apartamento. Só não me separei porque não sou casada mas confesso que, se possível fosse, me separaria de mim mesma e deixaria um outro eu na supervisão dos trabalhos.

Agora a pergunta é outra: por que é tão difícil fazer uma obra no Brasil? Registro algumas considerações a respeito.

Plantas elétricas e hidráulicas se perdem no tempo. Ou se contrata um engenheiro ou arquiteto que pega a planta na prefeitura ou certo é furar um cano de água, de gás ou romper a fiação. Detalhe: contratar um engenheiro ou arquiteto não é sinônimo de paz e tranquilidade e nem garantia frente a desastres. Detalhe dois: não estou falando de obras estruturais mas de algo como troca de revestimentos.

A comunicação da equipe é tortuosa. O que um faz o outro desmancha.

O orçamento sai o dobro e o prazo o triplo.

Não raro a equipe se amotina, principalmente quando comandada por uma mulher.

Os materiais são caros, chegam com atraso e a qualidade é duvidosa. Vendem rápido e depois transformam o SAC num martírio.

Claro que as divergências entre estilos, preferências, expectativas, gestão do orçamento e de pessoal e dedicação à causa também podem afastar dois anteriormente pombinhos durante a obra.

Mas a verdade é que a qualidade dos profissionais pode ser muito ruim. Na era do emprego precário, todo mundo faz tudo e ninguém faz nada direito. Quando você acha alguém sério e competente, como eu tive a sorte de pinçar alguns, guarde o cartãozinho no cofre sobre uma almofadinha vermelha.

Qualidade do material? Pague muito e ninguém lhe garante.

Preço? Num país em que uma torneira de cozinha pode custar mais que um salário mínimo, algo está muito errado. E não, esta torneira não lava a louça sozinha.

Sobreviveremos. Meio esgualepados mas sem desistir de mudar o país das obras insanas.